Onze de Setembro

Nem era uma preguiçosa segunda-feira, tampouco a tão aguardada sexta-feira, que a depender dos números, pode apresentar-se carregada de maus presságios. Era sim uma bela manhã de terça-feira. Como de costume, cedo havíamos acordado. O mundo pela janela se nos mostrava receptivo, havia um sol que punha mais verde as plantas, e mais cores as cores das coisas. Havia um azul num céu magnífico! Pardais esvoaçavam por entre os fios de alta tensão, e os beirais das casas, despreocupados da vida faziam algazarra. Quem sabe conhecessem o que disse Jesus, e Mateus narrou no seu evangelho, capítulo seis, versículos 26, 27 “Olhai as aves do céu; não semeiam nem ceifam; nem recolhem nos celeiros e vosso Pai celeste as alimenta. Não valei vós muito mais que elas? Qual de vós, por mais que se esforce, pode acrescentar um só côvado à duração de sua vida?” Mesmo assim, carregados estávamos com pensamentos e preocupações mundanas. Gosto das terças-feiras, particularmente por ter vindo ao mundo numa manhã de um dia como este. Minha companheira dali a dois dias faria aniversário. De certo tínhamos algo a providenciar. Ainda cedo saímos de casa, pra ir ao encontro da velha sala de aula, confabular conhecimentos com os pupilos. Aqui no hemisfério Sul dava-se de iniciar o verão. Na América a primavera. Já o dia corria pra concluir a primeira metade de sua jornada, quando os aparelhos de televisão do mundo inteiro interromperam seus desinteressantes programas matinais, pra noticiar o atentado ao World Trade Center em Nova Iorque. E quedaríamos estarrecidos com o que vimos e ouvimos.

Tantos pensamentos precederam àqueles instantes. Surpreendidos inicialmente com o fato estarrecedor. Para em seguida, aos poucos irmos assimilando o sinistro na medida do possível. Constatando o quanto o mundo à época já estava tão interligado. E que câmaras fotográficas e filmadoras focavam desde então tudo. Todo tempo, o tempo todo. Um dejavús real. O inverossímil tornado verossimilhança. Seria realmente verdade? Por mais perturbado que estivesse nosso coração naquele momento, tentávamos nos colocar na situação, nada fácil dos que viviam a situação. Só quem estava realmente passando é que poderia sentir de verdade. Tentávamos estabelecer paradoxos. E se fossemos nós? Que alvo estaria em foco? As torres gêmeas de Brasília? Queiramos ou não, nós brasileiros sempre fomos vistos pelo Talibã e principalmente pela Al-qaeda, como aliados dos americanos, não nos faziam distinção. Santana do Ipanema com certeza estaria em área considerada de risco. Não poderíamos deixar de nos colocar como zona de perigo, no caso de um possível ataque aéreo. Sempre seremos alvo vulnerável. Afinal os pontos mais extremados para as bandas européias e asiáticas ficam tão próximos de nós. A barreira do Inferno em Natal Rio Grande do Norte. A Ponta Seixas na Paraiba. Fernando de Noronha que ainda hoje é considerada ilha base militar.

Buscamos no fundo da memória, fatos extremados que um dia teria nos deixados perplexos, vividos o mais perto possível de nós santanenses. Dentre os que viveram esta geração. O maior monumento erguido por mãos humanas que temos em nossa cidade, a torre da matriz de Senhora Santana. É bem provável que deva ter a altura de um prédio de 30 andares. Um dia, o teto da nave da igreja viria a ruir, desabando por completo, felizmente sem ocasionar vítimas. Mesmo assim teria causado grande comoção na população. Jamais conceberíamos que o telhado da matriz de Senhora Santana um dia viesse à baixo, mas veio. Outros sinistros de nossas reminiscências referiam-se a fatores climáticos, as cheias do rio Ipanema que quase sempre deixam moradores ribeirinhos desabrigados. Felizmente não tínhamos lembranças de atos escabrosos de grande proporção ocasionados pela vil ação do homem.

As torres gêmeas nova-iorquinas, longe de nós estavam fisicamente. E muito mais longe estávamos de pensar que tivessem sido erguidas com o propósito de representar a ostentação do poderio americano, perante o mundo. Evocavam-nos muito mais, as cenas de filmes como King Kong e Inferno na Torre. Perante o que nos chegam constatações que nos levam a reflexões sobre as coisas. O que elas evocam e o que elas na verdade representam. Seria então nosso famoso “Corredor Mercantil”, que vai desde a ponte do Padre até a Estação Rodoviária, nosso World Trade Center? Incluiríamos aí o monumental prédio da Prefeitura Municipal. Câmara Legislativa nosso Capitólio. O Sétimo Batalhão da Polícia Militar de Alagoas, nosso Pentágono. Queira Deus que não tenhamos nunca inimigos sequiosos de vilipendiar, destruir os governos municipais e seus citadinos. Como acontecia no período Medieval onde as cidades combatiam entre si. Queira Deus que a “Volta Pela Estrada da Violência” nunca passe apenas de uma película cinematográfica, que um dia teria sido filmada pelas ruas de nossa cidade. Bem como gostaríamos de ouvir ao final da exibição sensacionalista da catástrofe de onze de setembro, o repórter finalizar a matéria dizendo: tudo isso não passou de mais cena pra compor uma fita hollywoodiana. Pena que não foi assim. E nunca mais, momento algum, em lugar nenhum do mundo foi o mesmo. Depois daquele dia.


Fabio Campos

Nenhum comentário:

Postar um comentário