Vã é a Casa dos Insanos (Salmos 127-128)

“Cânticos dos degraus de Salomão – Bem-aventurado aquele que teme ao Senhor e anda nos seus caminhos; Pois comerás do trabalho das tuas mãos, e te irá bem. A tua mulher será como a videira frutífera...Salmo 128-1,4)”

A um lugar bonito, chamado de Queimada do Rio - Sudeste da cidade de Santana do Ipanema – ficava a casa de José. Se a gente sair andando a margem do rio da imaginação, podemos vislumbrar donde vêm nomes tão carregados de música e forte significado. Vamos a um tempo em que os pais, ajuntavam a família, no prelúdio da primavera, indo ao preparo do solo, pra cultivar leguminosas e cereais, à várzea do Nilo santanense, feijão, consorciado com o milho. Noutra seara algodão e palma. O silo de trincheira acusava a preocupação com o período de estiagem que inevitavelmente viria. O gado lanado rebanhado na escalada do serrote, nos baixios e grotões. Ajuntava-se as coivaras. O fogo no aceiro selando a aliança do homem com Deus. Haveria de ter o holocausto, em agradecimento à fertilidade do solo. Assim, por essa ocasião ocorriam as queimadas do rio. 

José, nem vem a ser o personagem central de nossa história. Está aqui pra lembrar a gente, aquele do Egito, filho do profeta Jacó, e que também tinha onze irmãos. Isac, Zenon, Rubens, Natalicio, Benjamim, Jasão, Simeão, Levi, Joatan, Gaudino e Ageu. O José que está narrado na Bíblia, por inveja e ciúme dos irmãos, acabaria vendido a mercadores nômades, tornando-se escravo. O nosso José, não foi vendido, muito embora, assim como o hebreu, foi vítima de uma cilada dos seus irmãos. Quando veio a época da colheita daquele ano, seria acusado de roubo de parte da safra da família. Acabou preso. Encarcerado na Cadeia Pública de Santana do Ipanema, muito teria sofrido. Clamou aos céus por justiça, e Deus ouviria sua súplica. Muitas vezes acordava durante a noite aos gritos. Considerado louco, por alguns detentos, porque dizia ter visões premonitórias. Ditava visões de fatos futuros que realmente acabavam acontecendo. Dizia sobre o porvir de alguns encarcerados, de quando seriam libertados, e mesmo a morte de alguns deles previu. Ditou um presságio com o delegado, teria mandado lhe avisar para que não viajasse naquele dia, pois sonhara com um acidente ocorrido com a viatura da polícia. O delegado nem chegaria a receber o recado, mas por conta de um imprevisto acabou não viajando. O veículo capotou, não sobrou um sobrevivente. A par do ocorrido o homem da lei, meditou que realmente aquele rapaz era dotado de poder de decifrar sonhos.

Praça da Bandeira, monumento, rara beleza emprestada ao nobre bairro da cidade. Uma fileira de casas olhava pra igrejinha de Senhora Assunção. Diversificada colméia, de vidas. Casas simples encostada a outras mais imponentes. Também assim os protagonistas desse folhetim. Dividia o mesmo espaço urbano, comerciantes, jurista, pecuaristas, funcionários públicos. De família tradicional aqueles moradores. Pessoas cujos nomes, seus pais se inspirariam nos livros bíblicos para os batizarem. A casa de Maria, a casa de Jonas, a casa de João. Casa de Leonpoldo e casa de Aderaval. Encostadas umas nas outras, no linguajar matuto, faziam parede e meia. A prosperidade numa determinada proporcionalidade se distribuía por aquela artéria. Havia coisas, distribuídas de formas proporcionalmente desigual, que nem era, necessariamente os bens materiais. Vejamos.

A casa do profeta Jonas, simples, modesta, como verdadeiramente deve ser a casa do povo de Israel. Profícua e prolífera, como a geração de Abraão, cuja descendência se tornaria tão numerosa quanto a areia da praia. Assim como Abraão alcançou vasta idade, Jonas alcançou graça diante do senhor. Pois aquele, a despeito do número de anos de vida, teve com Hagar escrava de Sara, um filho varão, Ismael. E Deus poria a prova, sua fidelidade e fé. Seu filho primogênito pediria em oblação. No momento exato do holocausto, um anjo interveio, e indicou-lhe para o sacrifício, uma ovelha, pelos chifres presa a ramagem. Jonas bom cristão, criador de gente e gado. Algumas crias, mantinha no Cercado, que lhe dava o sustento a si, e sua numerosa prole. Agradecido a Deus, o que vinha do cultivo do campo, e do gado miúdo. A sua propriedade ficava onde seria construído o santuário de Nossa Senhora de Guadalupe, monumento erguido pela igreja pra marcar a entrada do novo milênio. José, não o do Egito, o profeta da Queimada do Rio, previu todos estes acontecimentos. Como previu outros acontecimentos pra outros moradores daquele logradouro. 

João, outro morador daquela artéria. Constituiu família e era vizinho de Jonas. Em sonho teve a visão da consumação dos tempos. Inspirado pro Deus escreveu o livro do Apocalipse. Como está dito nas Sagradas Escrituras. De suas narrações consta que a virgem santíssima ”Uma mulher preste a dar a luz, aflita pela dor do parto, foi arrebatada para o deserto. Uma fera pronta para devorar-lhe o filho assim que nascesse surgiu, e deu a luz a um filho homem que haveria de reger todas as nações e foi arrebatado para o céu ”. E narrou dos cavalheiros que viriam pra separar as ovelhas. Teve João do Senhor, o dom para o comércio, com prodigiosa habilidade sovava a massa e deitando-lhe fermento produzia alimento sagrado, o pão. No abate do gado suíno especializou-se, alimento considerado impuro pelos fariseus. Constituiu descendência modesta, criados sob a égide de Nossa Senhora Assunção, deles que seguiram a vocação da linhagem de Levi. De sua prole, viria com dom e domínio da palavra, falada e escrita. A instrução e o magistério sob os preceitos da santa igreja. Também José previra tudo isto no cárcere.

“Cânticos dos degraus de Salomão- Se o Senhor não edificar a casa, em vão trabalham os que a edificam, se o Senhor não guardar a cidade em vão vigia a sentinela. Salmo 127- 1,2”

A principal profecia do José do sertão, no entanto, não fora nenhuma dessas até então citadas. Vem a respeito de outros moradores daquele logradouro. Leonpoldo e Aderaval. Ambos prósperos pecuaristas.  Com mão de ferro governavam suas casas. Suas propriedades rurais, fazendas, administravam com vigor. Tinham vassalos que lhes prestavam serviços mediante ínfimos salários. A prepotência e a arrogância, via de regra, imperava. Sobejava austeridade em detrimento de compreensão e amor, as descendências e aos subalternos. E a mão pesada do infortúnio prevista por José profeta, cairia indubitavelmente sobre os incautos. José por essa época já a liberdade havia adquirido e disse: -Aqueles, não alcançarão velhice serena, no dia do velório não terão o choro dos seus entes queridos, somente o lamento onerado de carpideiras. Sua descendência se espalhará a ermo, nômades sem nunca fincarem alicerce em lugar algum. E o fogo se abaterá sobre seus bens os consumindo. Como de fato viria o fogo sobre a casa de um e a propriedade rural do outro. Precocemente deixaram este plano, e suas obras foram como pó levadas pelo vento. 

Fabio Campos

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