O Crime de Tagor Fashall - A ILHA - (Parte 2)


Tagor, e a praia. Tanto tinham pra descobrir um do outro. A faixa de terra, aos confins da terra indo. O cabelo de Antonieta gritava ao vento, almejando  mesmo infindo mundo de areia. Os olhos, porem jamais alcançariam. Coqueiral feito pingente espetando o céu de longos palitos, marrons. Ostentação de buques, exuberância de palmas verdes. Cachos frutíferos de alvas polpas, dente de leite, de caldo salubre. Embora não parecesse, havia civilidade, havia vestes de bordados, vestes de muito esmero. Seu perfume tinha um quê de selvagem. Fio de fina poeira, batizando de sal, e de sol, o dia. O mar declamando poesia ao vento de barcos e jangadas, que nunca atracavam. O mar, recitando versos, de marinheiros que jamais pisaram terra firme. O mar, de piratas e corsários que viviam buscando tesouros perdidos. Tesouros guardados por espíritos de gente morrida de morte atormentada. E não satisfeitas, nem conformadas com a partida adiantada, jamais aceitariam que viessem buscar o que sempre lhes pertencera. 

Os meninos das bicicletas. Do nada, se perceberam que velhos estariam ficando. Cinco, sete e nove anos tinham, quando se deram conta disso. E quedaram de tristeza, ao descobrirem que os velhos eram pessoas tristes. E desejaram do fundo de suas almas jamais ficarem grandes, e velhos. E ter que assumir destinos que fizesse com que ficassem distantes uns dos outros. E nunca mais se veriam, não como antes. Por ocasião das festas do padroeiro da vila, quando tivessem oportunidade, ao se verem, disfarçariam, baixariam a cabeça, olhariam pro lado contrário. E tristemente seguiriam seus pobres caminhos. Sem o menor escrúpulo a sepultarem meninos vivos. Por asfixia morreriam seus pobres coraçõezinhos. Aqueles meninos precisavam conhecer Tagor Fashall. Com ele buscariam o que mais queriam, o segredo para chegar a ilha da eternidade. Onde eternamente meninos brincavam na praça. Onde eternamente seria o para sempre de suas vidas. Marcos, João e Lucas iam pra escola. Lucas estudava em duas escolas. Uma na vila, e outra que ficava num lugar além do que permitia seu entendimento. Nenhuma ficava perto de sua casa. Tão distante que ele pensava que talvez não existisse, porque tinha que acordar muito cedo e saía de casa praticamente dormindo. Escovava os dentes dormindo, tomava café dormindo, entrava no ônibus dormindo. E sonhava que estava indo. Por isso considerava que uma escola era de verdade e a outra só existia em um mundo onde não havia homens, nem velhos. Somente meninos sagazes como Tagor Fashall.

 Um bando de facínoras avançava pela praia. Não viam os meninos, os meninos no entanto os viam, dentro dos seus sonhos. Naquele entardecer da cor de sangue, de olhares aflitos, com vigor avançavam os homens ferozes. Tagor Fashall também os via. Dispostos a lutar, até a morte eles lutariam. Ainda que pela sétima morte consecutiva, lutariam. Contra os espíritos guardiões de segredos, de ricos tesouros, de sonhos de aventureiros, escondidos. Sonhos possuidores de forma e luz, não muito bem definidas. E era tanto brilho que punham-nos cegos, cegos de furor e ambição. Tagor e Antonieta estavam lá. E porque se ocultaram não foram vistos. Muito perto de descobrir o mistério do terrível monumento. A estátua de Mutuno Tutuno. Para não se tornar prisioneiro eterno da caverna, o segredo era não encarar o tontem talhado na pedra, no interior da caverna. Ele estava lá no meio da floresta, da ilha que abrigava suntuosa riqueza em ouro puro! Ao ficar de frente a estátua do bisão de bronze empinando as patas dianteiras o pênis ereto. Nenhuma mulher devia fixar os olhos, nos olhos de pedras de jaspe do deus Mutuno Tutuno pra não ser por ele enfeitiçadas. As virgens que pretendiam se casar, naquele ano, tinham que passar pelo ritual pré-nupcial. Sob uma espécie de transe, eram obrigadas a serem desvirginadas fazendo sexo com a estátua de Mutuno Tutuno. 

Tagor sabia que em algum lugar daquele altar de sacrifícios, havia um dispositivo escondido. E que ao ser tocado abriria o portal que daria acesso à sala do tesouro milenar. Ele viu em sonho, era uma montanha de peças em ouro fundido. Pertences reais, de toda dinastia de imperadores Inca. Urnas mortuárias guardavam cabeças de nativos mumificadas, ossos de animais selvagens, carcaças de javalis, entre os caninos exibiam ossos humanos. Estendidos feito varais um hieróglifo feito de cordéis enlaçados, narrava uma epopeia de luta entre desbravadores e nativos, acontecido a dois mil anos antes daqueles dias. A gênesis de tudo, dos povos andinos. A narração em versos encerrava porem um código de acesso. Era preciso traduzir a narrativa escrita num dialeto Inca, depois juntar as quintas letras de cada palavra, uma mensagem seria decodificada,  que revelaria onde se encontrava o tesouro encantado. Uma maldição porem, cairia sobre aquele que na tentativa de decifrar, falhasse um sinal sequer que fosse. Imediatamente entraria num processo de decomposição, e mumificação. Maldito tesouro encantado! Não fora a civilização  que escondera o mistério como muitos acreditavam que fosse. Tagor temia apenas uma coisa, que os alienígenas encontrassem primeiro que ele o precioso relicário, do vil metal.

O bando acabou chegando à entrada da caverna. Não sabiam, mas a trilha que seguiam levaria a um imenso vão que parecia uma espécie de estaleiro, e laboratório. Aonde seres alienígenas realizavam pesquisas. Tagor a beira dum regaço, viu o interior da caverna se refletindo no espelho d’água. Viu Morion Lucindo trabalhando junto com os alienígenas. Entendeu que os homens do espaço o trouxera da terra dos mortos, porque tinha conhecimentos sobre metais. Além do que leram em sua mente a história do tesouro. Nem todos os motinados haviam entrado na caverna. Deles que ficara montando vigília num acampamento próximo a entrada da gruta. Os que haviam entrado, secretamente espiavam os extraterrestres, que realizavam estudos em cadáveres de nativos. O calor, o mau cheiro dos seus corpos, acabaria denunciando a presença dos intrusos. Não teve como não haver luta. Uma luta desigual, desumana. Pobres amotinados atacaram com o que tinham espadas, adagas, porretes. Enquanto que seus adversários, possuíam armas poderosíssimas, capazes de desintegrar um homem em milésimo de segundos. 

O primeiro encontro de Tagor e Antonieta foi a coisa mais linda que o mundo um dia pode presenciar. Por um bom tempo permaneceram calados, enlaçados. Como se dois corpos fosse um só. Pareceu o momento da Criação. Primeiro homem, primeira mulher, por Deus, na areia da praia moldados. A pele granulada de quartzo e frio, ainda guardava o cheiro, como de sabonete Alma de Flores depois do banho. O perfume passeando sobre as unhas, de dedos longos exploravam vastos e perfeitos montes dos seus corpos. Narinas e pupilas dilatadas. Nada, nada daquilo tinha de comum. Suas roupas largadas, pacientemente esperavam. Os cílios intumescidos, molhados de amor. Olhavam pro alto mar, sem precisar de resposta alguma. Até porque não queriam, nada mais interessava. A bela moça não era mais menina, não era mais criança. Nunca, jamais fora. 

A grande máquina dos homúnculos do espaço, através do ouro como matéria prima, produziria um elemento químico que seria útil no planeta Urano donde vieram. Pelo menos dois mil anos-luz distando da terra. Tinham que levar pra seu planeta todo ouro que encontrassem no subsolo da terra. Os Uranianos tinham a aparência, um misto de gente e de répteis gigantes. Mediam cerca de dois metros de altura, e suas mãos e braços se alongavam feito línguas de sapo, sempre que quisessem. A máquina de fabricar Megano ficava bem no centro da gruta. Dotada de centenas de painéis com luzes piscando, braços mecânicos, piças biônicas, roldanas cibernéticas, e coroas dentadas. Uma luz de cor verde  emitida como um raio quase invisível subia até o firmamento. Um elo de ligação com uma nave-mãe, suspensa muito acima da extratosfera. O bando que ficara na entrada da gruta, nada sabia do combate em que seus companheiros se envolvera, e que foram praticamente dizimados. Sob a luz da lua realizava o ritual do milho, uma dança de agradecimento ao deus Zea May, faziam uso de plantas alucinógena. Também mastigavam a folha cujo sumo provocava uma dormência na boca e tinham visões fantasmagóricas. 

O menino Marcos, o que tinha cinco anos, de repente estava lá. Bem no meio da selva, sozinho. Como tinha ido parar lá sinceramente não sabia. Certeza não tinha se era tudo real, ou se se tratava de sonho, a caminho da escola, no banco do ônibus escolar dormia. Marcos, já conseguia ler as primeiras palavras, e leu: “F.A.S.HALL” no bojo metálico do míssil que jazia no início da escadaria do templo. Na verdade uma sigla, que significava: “Tudo pela Força Aérea da Sérvia” O míssil, o templo, a ilha, o que de real havia naquilo tudo, além dele? Uma coisa entendia precisava encontrar Tagor. Pensou que o melhor que fazia era fechar os olhos, e voltar pra dentro do seu sonho de verdade. E claro, torcer pra não mais acordar naquele lugar. Algo gigantesco que provocava tremores compassados no chão se aproximava. Monstruosos o suficiente para destroçar árvores enormes com facilidade espantosa. A muito, encontrar um dinossauro, era tudo o que mais queria. Jamais considerando, no entanto, aquele, lugar, nem momento, pra que isso acontecesse. É sempre assim, quanto mais uma coisa negamos, mais o universo conspira pra que aconteça.

Fabio Campos 02 de Junho de 2015. (Ainda não é o fim. Aguarde; Continua...)

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