TAGOR - A REDENÇÃO (30º Episódio)

Tudo de antes, estava de voltava, agora, com muito mais ênfase. O povo na Praça Champs Élysées, em Paris. A multidão, naquela manhã de sábado, ia assistir a mais uma execução. O senhor Tagor Zabulon Fashall, dali a alguns instantes morto seria pela guilhotina. Os dias que permanecera no cárcere deixou-o muito magro, o rosto ossudo. O cabelo e a barba haviam crescido. Usava uma camisola, chamada de túnica dos condenados. Na cadeia da corte o ministro das execuções de justiça, determinava ao carcereiro que na hora de morrer o réu, deveria estar usando apenas aquela vestimenta, era peça única, alva, de linho. Trajos que seus parentes poderiam ficar com ele, bem como os objetos pessoais do morto, depois de aplicada a pena.  Lívido, de pés descalços, ladeado por dois verdugos com carapuças na cabeça, seguia. Devagar subia os degraus do patíbulo. Iria pagar pelos crimes que cometera, devagar subia. Mas que crime hediondo teria cometido contra a corte francesa pra merecer a guilhotina?

Os meninos das bicicletas, Marcos, João e Tiago na Praça da Bandeira passeavam. Subitamente pararam pra ver onde o amigo Tagor naquele momento se encontrava. O portal do tempo, novamente se abriu, e os mostrou. A claraboia da torre da Capela de Nossa Senhora Assunção foi crescendo, crescendo, até virar um imenso portal. Como a tela panorâmica do cine Alvorada. E puderam contemplar, debaixo de um céu de chumbo, entristecido, desenhado exclusivamente pra aquele momento, preludiando o que estava pra acontecer. Os pombos voavam, tanto aqui como lá, de um sobrado pro outro. Antonieta, de lá do interior da igreja de Santa Étienne-du-Mont, de joelhos, com um véu sobre a cabeça, rezava, sob a imagem de Santa Genoveva.

No hemisfério de cima era tempo de início da primavera. Alguns filhos desse mundo receberiam por batismo o nome de April, em referência ao mês que abria o bom tempo da primavera. E poder dar adeus ao rigor do frio, da clausura de dentro das casas, da lareira como sendo o ponto central de tudo. Com a chegada da estação das flores, tudo mudaria, os campos ficavam mais vistosos, as cores se tornavam abruptamente realçadas. Como a estação da alegria estava implantada, nada no mundo podia lembrar tristeza, em tal época. Parecia que o tempo passava a andar mais lentamente, como que querendo aproveitar melhor cada instante daqueles momentos. É muito provável que Deus, tivesse criado as estações do ano, para que Abel pudesse dividir o tempo em: tempo de pastoreio, tempo do aprisco, tempo da apartação,  ou desmame, e tempo da cobertura das ovelhas pelos cabritos. Caim por sua vez, saberia em que época devia cultivar: frutas, legumes, flores, hortaliças. Nessa época Deus andava no mundo, e admirava-se de sua obra “Gênesis 3:7,8”, e portanto está dito: “e viu que tudo que tinha feito era bom “Gênesis 1:10”

O Primeiro crime de Tagor, somente ele sabia que havia cometido. Havia roubado um álbum de figurinhas do seu amigo Ricardo que morava na rua do mercado. Muitas foram as vezes que fora ele e os amigo pra casa de Ricarte e o irmão, pra brincarem no quintal. Lembrava que havia uma cisterna cheia d’água da chuva, que os meninos mergulhavam pra tomar banho. Era muito profunda só entrava quem sabia nadar. E assim passavam praticamente o dia inteiro. Os pais dos amigos iam pro sítio Batatal. Então aproveitavam, por ficarem em casa sozinhos, faziam a festa. Os amigos vinham fazer companhia, e tomavam banho na cisterna. E depois que abusavam de tanto banho, brincavam de muitas outras coisas. De jogar dama, ludo e baralho. De bafo-bafo com figurinhas. E juntavam moedas, e compravam refrigerantes, pães e salame e comiam com avidez porque as atividades físicas dava muito fome. Tagor aproveitando a distração deles, apanhou um álbum de colecionar, que tinha futebol como tema, e tinha uma capa verde, e as figurinhas eram como medalhas de latão, redondas, autocolantes. Derick o gato viu tudo, foi a única testemunha do primeiro crime de Tagor.

Leviatã odiava o Criador e toda sua obra. Jamais aceitava a perfeição, onde houvesse paz tentaria instalar o caos. E desde então, onde pudesse desmanchar tudo de bom que Ele havia feito, tentaria. E Deus disse a Adão e Eva, depois de expulsá-los do paraíso, que dali por diante iriam suar suor dos seus rostos para adquirirem seu sustento, e os expulsou do jardim do Éden. Mas era preciso que se entendesse que isso, não significava necessariamente que haveria mais castigo pra uma região, em detrimento de primícias pra outras partes do mundo. Os meninos das bicicletas, muito queriam entender porque na região que moravam passavam anos a fio de muita seca. As estiagens prolongadas fazia seus pais perderem rebanhos, plantações. Não dava pra entender porque muitos dos aldeões que possuíam glebas de terras e cultivavam e criavam, assim como Caim e Abel, e conformavam-se a verem o gado morrendo sem nada puder fazer. E suas montanhas a ficarem peladas, destituídas dos vegetais que tão belamente ornavam outrora. Agora praticamente desapareceram, escassearam e tornara tudo tão árido e inóspito. Tempo dos sertões entristecidos chorarem sua dor.

A medida que subia o patíbulo, e aproximava-se do terrível instrumento de causar morte, e morte artificial, Tagor, via passar na sua frente, como num filme, momento a momento da sua vida. A infância junto a seus outros seis irmãos, os ensinamentos recebidos de seus pais. O respeito que deviam, ele e os irmãos, devotar aos mais velhos, a sabedoria que deles poderia adquirir. As reverencias religiosas, recitar três vezes por dia versículos de salmos bíblicos, ao cair da tarde a recitação do santo terço, pedir a benção aos pais, tios e avós pelo menos três vezes por dia, caso estivesse em suas presenças, por ocasião de acordar ao levantar-se, ao fazer a refeição principal do almoço, e ao recolher-se para dormir. Se pudesse escolher, a forma como queria ser executado, talvez não soubesse direito, se ia preferir morrer como o amigo Joaquim, o alferes lá de Minas, que morrera dependurado numa corda. E ainda por cima o esquartejamento. Dizem que até mesmo o terreno da sua casa teria sido salgado, Deus, quanto ódio contra um homem e seu ideal de liberdade. O Cristo Jesus, este outro amigo, também sofreu martírio, só que injustamente sofrera.

Tagor lembrava agora, do seu segundo crime, que teria cometido, matara Derick o gato de seu melhor amigo. Depois daquele dia em diante, botou na cabeça que detestava gatos. Isso porque o olhar do bichano, ao vê-lo cometer o primeiro crime foi inquisidor, até hoje ao lembrar incomodava-se. Jamais esqueceria o olhar do gato sobre ele. Penetrando seu olhar, como se soubesse que o que ele estava fazendo era errado.  Mas o que realmente o levaria a matar Derick, fora porque muitos anos depois o bichano, que nunca se apartaria do seu convívio, foi morar na rua de uma outra vida sua, já na idade adulta. Ali se reconheceram e passaram a viver. E eis que Derick acabou comendo um seu Hamster, um roedor que comprara na feira do rato, pra ter um amigo e companheiro, e o mantinha preso numa gaiola. Alimentava-o, conversava com ele e devotava-lhe cuidados diariamente. O amigo vizinho dono de Derick, jamais ficara sabendo que tinha sido ele, que colocara veneno pro gato morrer. Esse era um dos crimes que, mesmo não sendo do conhecimento da justiça francesa, estava ele levando pra guilhotina.

O terceiro crime de Tagor, dizia razão a coroa francesa. O que parecia sim, ser o menos grave crime. Depois de ter sido absolvido da acusação injusta de ter matado mestre Morion Lucindo, o ferreiro, que acabara ressuscitando. Tagor agora se via sob a acusação de lesar a coroa francesa. Era acusado de ser contrabandista, desviando ouro das reservas reais de França. Isso fazia ao apoiar as escavações e intervenções dos aliens em terras francesas. Estariam os extraterrestres levando pro espaço, mais precisamente pro planeta Urano, o metal precioso para a produção de Megano o vital alimento e combustível dos aliens.

Os meninos das bicicletas, se iniciaram numa discussão sobre o que poderiam fazer pra libertar Tagor. E conseguir tirá-lo daquela situação periclitante que se encontrava. E se havia real possibilidade disso. Certeza tinham que obstáculos existiam, primeiro teriam que entrar no túnel do tempo, e se conseguissem, pois fácil não seria, teriam que enfrentar a corte com seus batalhões de soldados rigorosamente armados, além de uma multidão ávida por ver mais um condenado executado. Não sabiam se podiam contar com a ajuda dos alienígenas A verdade é que eles sempre precisaram de Tagor, quem sabe Derick, o gato seu amigo pudesse ajuda-lo. Rafael Bertrand, de longe apenas assistia, motivo não tinha para envolver-se, aliás Tagor pra ele não passava de um desconhecido, um pobre desafortunado. Mestre Lucindo, nem este podia evitar o holocausto, infelizmente nem estava lá, seu paradeiro, naquele momento, era outra galáxia muito distante da terra. Antonieta, não tendo outra coisa a fazer rezava.

Um frade capuchinho foi trazido pelos soldados da guarda francesa, conduzido até a parte superior do patíbulo, para encomendar a alma do condenado. O capuz da sua veste de franciscano estava levantado de modo que ninguém conseguia ver seu rosto. Ao chegar de frente a Tagor ele retirou o capuz. E todos puderam ver, o próprio Tagor de frente a ele mesmo. Só que mais novo, sem barba, nem cabelo grande. E apenas disse: “-Fique tranquilo, estou aqui para te salvar.”

Fabio Campos, 22 de Abril de 2017.

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